Após analisar cuidadosamente os relatos de muitas das pessoas que tenho conhecido nos últimos tempos, penso ter descoberto uma nova patologia psiquiátrica: Perturbação de Personalidade Comum. Detectei a existência deste distúrbio ao perceber que, a grande maioria das pessoas que tenho vindo a conhecer, apresentam exactamente as mesmas características. Ou seja, apesar de fisicamente distintas, todas elas partilham a mesma personalidade. Descrevo, de seguida, o perfil da pessoa que sofre de Personalidade Comum:
É uma pessoa humilde, tolerante e um bocado tímida. Tem sentido de humor e não faz julgamentos. É solidária, gosta de ajudar os outros e faz voluntariado. Detesta injustiças, gente falsa e hipocrisia. É genuína, não fala nas costas, é frontal e não tem problema nenhum em dizer tudo na cara.
Acha que o dinheiro não é o mais importante e que o que realmente interessa é o coração. Mas não é uma pessoa fácil de aturar, porque é muito independente, tem uma personalidade forte e é um bocado teimosa. Ou se gosta dela ou se detesta, não há meio-termo.
Os seus lemas de vida são «segue os teus sonhos», «vive um dia de cada vez», e «sê quem tu és». Os seus ídolos são Gandhi, Martin Luther King e Madre Teresa de Calcutá. Gosta de sushi, teatro, fotografia e música, embora não ouça as bandas mais comerciais. Só compra marcas portuguesas, não vê televisão e adora ler, sendo o seu autor preferido Fernando Pessoa.
É empreendedora, pró-activa, dinâmica e criativa. Trabalha desde nova, conseguindo todos os seus empregos por mérito próprio e nunca por cunhas. É assertiva, trabalha bem em equipa e sabe reconhecer quando erra. Trabalha demais e recebe de menos. É esforçada e competente, das melhores no seu emprego, mas os colegas e o patrão estão sempre a tentar prejudicá-la. Só que ela não tem medo e responde-lhes sempre à letra.
Entende bastante de política, economia e futebol. Percebe todos os esquemas que acontecem porque conhece pessoas influentes em cada um desses meios. Identifica os problemas do mundo – dinheiro, corrupção e crise de valores – e tem as soluções, embora não as possa pôr em prática porque o sistema não o permite.
Vota em consciência e faz questão de fazer intervenção através das redes sociais e de manifestações de rua. É anti-catolicista, anti-capitalista e anti-materialista. Insurge-se contra o racismo, a xenofobia e a discriminação. É activista dos direitos dos animais, faz a reciclagem e defende o ambiente, a sustentabilidade e o espírito comunitário.
Se o leitor conhecer alguma pessoa com este perfil, por favor informe-a que sofre de uma perturbação psiquiátrica. Ah, quase me esquecia do principal traço que caracteriza as pessoas que sofrem de Personalidade Comum: falta de individualidade e de pensamento próprio. ■